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De tempos em tempos, a humanidade entra em crise para repensar suas verdades absolutas. Houve reis que se pensaram deuses, mas que pouco puderam fazer diante da chegada da república e da democracia. Negócios hegemônicos na econômica analógica ruíram com a onda tecnológica que se impôs sem pedir licença.

O hábito consagrado de sair de casa e ir trabalhar na empresa caiu como um sopro diante da ameaça do covid-19, fazendo do home office uma possibilidade eficaz e produtiva do presente. E, assim, poderíamos ir indo enumerando situações sucessivamente.

Sim, sabemos que a vida a muda, mas, contraditoriamente, precisamos de algum tipo de referencial estável; parece que a sensação de fluidez constante nos gera um tipo de insegurança existencial; sem um chão para chamar de nosso, ficamos perdidos na suspensão do ar.

A questão é que estamos diante de um profundo processo de reestruturação conceitual das lógicas da vida vivida. A desmaterialização da economia nos obriga a sermos mais sensitivos sem perder a capacidade da construção concreta. Se antes, por exemplo, precisávamos de cabos entre dois pontos para a transmissão de dados, hoje podemos transmitir informações pelo ar. Parece um milagre, mas é real. O processo faz imitar o afeto, no qual, mesmo à distância, emite suas vivas ondas de sentimento. Ou seja, a tecnologia não deixa de ser um projeto de libertação e reconstrução daquilo que nos faz humanos.

Nesse sentido, a própria noção tradicional de equilíbrio está superada. Hoje, não mais podemos ser um tripé parado em nós mesmos; o equilíbrio atual, ao invés de estático, é essencialmente dinâmico, como o andar da bicicleta que faz do movimento o balanço exato para não cair aos lados. A partir daí, o caminho que vamos seguir e a velocidade que vamos pedalar é um ato de liberdade pessoal, sendo que a inércia, aqui, não passa de uma força redutora.

E você que foi líder ontem corre o risco de ser um mero liderado amanhã. Isso porque a liderança não se faz mais por um critério sanguíneo ou hierárquico de autoridade posta, mas de diária confiança e legitimação sobre seu time. As pessoas que jogam contigo devem ter prazer, alegria e respeito por aquilo que o líder representa: um norte de luz e, não, uma fonte de escuridão. Aliás, como bem disse Romain Rolland, a correção de uma injustiça não conserta o mundo, mas ilumina um dia.

Num momento em que muitas convicções desmoronam, precisamos urgentemente de luzes sobre nossos passos e suas respectivas possibilidades de futuro. Precisamos, portanto, de líderes autênticos. Afinal, liderar é um gesto genuíno de responsabilidade sobre si, para com outros e perante a sociedade em que vivemos. E, nessa soma virtuosa, diariamente nos fazemos mais e melhores.

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Sebastião Ventura

Advogado, especialista em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande Sul. Ver perfil completo >>