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Já participei de reuniões em que todos falavam — menos quem mandava.

E já estive em conselhos onde a decisão não era feita por quem tinha o maior título, mas por quem segurava as alianças mais antigas.

A verdade é que o jogo de poder raramente está onde se diz que está.

Em muitas organizações, o cargo mais alto é quase uma formalidade. Um papel protocolar, necessário para manter a ordem aparente. Mas o poder real — aquele que move ou bloqueia decisões, que aprova projetos, que define quem fica e quem sai — costuma operar por baixo da superfície, em circuitos informais, pactos implícitos, lealdades subterrâneas.

Foi observando essas cenas que fui buscando lentes mais agudas para entender esse deslocamento entre autoridade e poder. Entre o que é visível na estrutura e o que de fato comanda o fluxo da organização.

Jeffrey Pfeffer nomeia isso sem pudor: o poder raramente é transparente. É performado, acumulado e, muitas vezes, protegido a partir de jogos simbólicos — quem senta ao lado de quem, quem interrompe quem, quem nunca é contrariado. Às vezes, o jogo é tão bem disfarçado que nem quem joga percebe o quanto está dentro dele.

E, quando nomeamos isso em uma conversa? Costuma incomodar. Porque falar sobre poder mexe com os arranjos invisíveis que sustentam as dinâmicas de pertencimento, reconhecimento e exclusão. O que está em jogo não é apenas quem decide, mas quem se sente autorizado a existir com liberdade.

É por isso que o convite de Julie Battilana é tão corajoso: ela propõe que o poder seja entendido como algo relacional, e, portanto, sujeito a movimento. Não se trata de negar que o jogo existe — mas de criar novas regras, mais conscientes. Ela nos lembra que toda pessoa tem algum tipo de poder. E que, ao reconhecê-lo, podemos escolher se o usamos para consolidar um território ou para ampliar a paisagem.

Mas mexer nesse jogo implica desconforto. E, aqui, Ronald Heifetz nos aponta uma travessia difícil: liderar é manter o sistema em desequilíbrio suficiente para que ele possa evoluir — sem que entre em colapso. É sustentar o calor das tensões sem resolvê-las prematuramente. É não fugir da verdade mais difícil de todas: que as mudanças reais, muitas vezes, desagradam os mesmos que nos colocaram na posição de liderança.

Por isso, a pergunta permanece como um espelho incômodo. Quem realmente decide aqui?

Quem ocupa o poder de fato — e quem apenas o representa?

Quem é ouvido antes mesmo de falar — e quem, mesmo gritando, continua invisível?

Em toda organização existe um “poder paralelo” — às vezes velado, às vezes celebrado como “jogo político”. O risco não está em ele existir. O risco está em não olharmos para ele.

Porque o que não se nomeia, governa no escuro.

E o que governa no escuro, paralisa a transformação.

4 Comentários

  • Maria Elena Johannpeter disse:

    Mto bem posto Bibiana. Tema relevante, mas incomodativo para ser evidenciado. Aliás, as relações humanas passam por “esse faz de conta” para não nos incomodarmos. Meu abraço.

  • Cristian disse:

    Concordo Bibiana, parabéns pela reflexão. O maior papel do líder é ser um guardião da cultura, um catalizador da inovação, um vendedor da esperança, um formador de líderes e um assassino do medo. Se este papel não está no topo da pirâmide, alguém tem que assumir esta missão para a perenidade do negócio.

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Bibiana Zereu

Empresária, Psicóloga, Consultora e Advisor em temas de Desenvolvimento Humano e Organizacional. Mestre pela FGV em Gestão Estratégica. Especialização em Empresas Familiares - Barcelona. Conselheira para Startups pela Board Academy. Experiência de 30 anos em desenvolvimento Humano.