A erosão qualitativa da democracia é brutal, para não dizer assustadora. Infelizmente, o cidadão não mais acredita na política e nos políticos. Cansou de ser enganado. Não quer mais ser tratado como tolo. No redemoinho das angústias, as redes sociais – ou seriam antissociais? – materializam a raiva contra o sistema estabelecido. Diante da baixa responsividade das instituições, um mar de insatisfações febris invade a cena pela pública pela via digital. Enquanto isso, no chão da vida, a política segue jogando contra a democracia, criando leis descabidas e privilégios insustentáveis, através do uso e abuso da mentira como instrumento de enganação popular.
O cenário é definitivamente sombrio; a decadência institucional é aguda.
Em recente artigo na The Atlantic (“After Babel – How social media dissolved the mortar of society and made America stupid”), a inteligência crítica de Jonathan Haidt fez primorosa análise dos efeitos nocivos das mídias sociais sobre as instituições democráticas, advertindo que as redes sociais acabaram por conceder poder aos agitadores e provocadores enquanto silenciaram os bons cidadãos, esvaziando o papel estrutural do dissenso político na democracia; entre irracionais manadas furiosas, que tratam os eventuais divergentes como inimigos radicais, “se não fizermos grandes mudanças em breve, nossas instituições, nosso sistema político e nossa sociedade poderão entrar em colapso durante a próxima grande guerra, pandemia, colapso financeiro ou crise constitucional”.
O fato é que a tecnologia revolucionou o mundo da comunicação e, ao mesmo tempo, involucionou nossa capacidade de compreensão das diferenças humanas. A pressa afoga o pensamento crítico superior. Tudo está muito rápido, acessível e prático. O problema é que a vida vivida é complexa, exige reflexão superior e ações pautadas pelo imperativo da razão pensante.
Sem cortinas, o impressionante processo de aceleração da realidade nos faz passar batido por sutis aspectos de alta relevância. No turbilhão dos dias, não mais dispomos de tempo para análises de detalhes, particularidades ou circunstâncias únicas. O sofisticado processo tecnológico de massificação cognitiva paralisa o ímpeto reflexivo; silenciosamente, estamos sendo reduzidos a modelos de escolhas “all or nothing”, estimulando a platitude de polaridades rasas e suas tacanhas lógicas binárias, incompatíveis a problemas complexos da realidade posta.
Felizmente, nenhuma tragédia dura para sempre. Todavia, os fluxos e refluxos da História nem sempre seguem uma lógica cartesiana. Entre avanços e retrocessos, o poder tem razões que a própria Razão desconhece. No vazio da política consciente, a estupidez tem lugar no altar. O processo deletério em curso, mundo afora, não apenas ameaça conquistas democráticas, mas a próprio império da civilização, erguido em premissas de entendimento, ordem e justiça.
Encerro com a sabedoria de Rui: “O motim não é democracia; a celeuma não é o parlamento; a rua não é o país; o incêndio não é razão; o crime não é o direito; o assassínio não é a justiça; a anarquia não és tu, ó Liberdade”. Portanto, não será rebaixando os modos que elevaremos o Brasil.
Preciso. Qto à Política, o Establishment que herdamos, pois assim o fizemos, apodreceu de vez.
Em mais, às vezes dá até vontade de perguntar: Tecnologias deveriam mesmo estar ao acesso de todos? CRÚZ!