A pandemia chegou sem pedir nenhuma licença. Nossos planos evaporaram. A lista de afazeres da virada de ano teve que ser completamente revista. Ficamos mais em casa. Tivemos mais tempo de estar mais próximos das pessoas que escolhemos para construir nossas vidas.
Nos deparamos com a morte, e isso faz rever absolutamente tudo. Morte seja daqueles que partiram desse plano, seja a morte metafórica dos que ficaram. Me atrevo a dizer que todos, de um certo modo, estão revendo suas vidas, e isso é viver a experiência da morte no sentido metafísico.
Quais escolhas fiz que não fazem mais sentido? O que quero daqui pra frente? O fato de nos recolhermos, o que nunca tínhamos tempo antes, nos faz refletir sobre o que realmente importa.
Este vírus avassalador mostra que “o essencial é invisível aos olhos”, como já dizia o Pequeno Príncipe.
Ao assessorar centenas de casos de executivos e gestores de diversos países da América Latina, seja em mentorias individuais, seja em programas de educação corporativa, definitivamente meu trabalho tem sido no apoio emocional aos enormes desafios que todos tem lidado desde o início do ano.
Não tem um caso que tenha atendido que não esteja revendo a rota. Seja no seu papel como gestor, seja na forma de gerar resultado, seja na sua carreira. Sempre me impressiono como a humanidade precisa da crise para evoluir e questionar sobre o sentido da vida.
Enquanto muitas pesquisas apontavam nos últimos anos que as profissões do futuro estariam atreladas à tecnologia (big data, robotização, growth hacking etc.), na Sonata Brasil, escola de liderança que sou co-fundadora, alertávamos que não poderíamos esquecer que o futuro é humano.
Olhar para saúde mental é condição para seguirmos como humanidade. Pesquisas apontam que os gastos com doenças psíquicas chegarão a 6 trilhões de dólares até 2030. Profissões nas áreas da psicologia, psiquiatria, terapias dos mais diversos tipos e tudo que estiver ligado ao cuidado são e serão cada vez mais as profissões do futuro. Claro que se aliadas a tecnologia muito melhor pois amplia e democratiza o alcance. Não é tecnologia ou humano, mas sim tecnologia e sobretudo humano.
É hora de parar e refletir sobre qual futuro queremos e devemos construir.
No aspecto individual, precisamos definitivamente incluir o autocuidado e tempo para si na agenda. É sabido que quanto mais saudável é a pessoa, em todos os aspectos (físico, emocional, mental e espiritual), maior sua imunidade. Como alimento corpo, mente, emoção e espírito? E esse processo é indelegável! A saúde integral é um dos principais escudos que temos, e que inclusive reduz significativamente o medo. Que venha logo a vacina para contribuir com a saúde pública global. Mas cabe ressaltar que o vírus não irá sumir, mesmo com vacina. Somos nós que temos que mudar. Rever a forma do que consumimos e como tratamos nosso corpo, templo de nosso espírito.
Talvez o maior ensinamento da pandemia seja a necessidade do cuidado. Já dizia o filósofo e educador colombiano Bernardo Toro que a ética do cuidado é fundamental para nortear as relações do presente e futuro. “É preciso cuidar de si, do outro e do espírito”.
No aspecto organizacional, é preciso rever a forma como geramos riqueza. Parafraseando o livro de Raj Sisodia, o fundador do capitalismo consciente, e de Michael Gelb, as empresas do futuro são as que curam. Nesta obra, os autores trazem uma pesquisa alarmante. Qual o custo existencial do desenvolvimento? Um dos lugares mais inovadores do planeta, Palo Alto na Califórnia, apresenta a maior taxa de suicídio dos Estados Unidos. Esse dado mostra que sofrimento não desaparece com o aumento da prosperidade, ressaltam os autores.
O lucro, na minha esperançosa visão, não poderá mais estar atrelado apenas ao resultado financeiro mas sim mensurado pelo bem estar de todas as pessoas envolvidas com o negócio. Quanto mais saudáveis as pessoas estiverem, por consequência mais próspera será a empresa. E neste quesito o índice ESG que avalia a governança sustentável dos negócios pode contribuir sobremaneira, claro quando aplicado genuinamente.
Como empreendedora, educadora e pesquisadora na área de gestão, talvez tenhamos que inclusive repensar a formação dos futuros gestores, que terão que administrar não só recursos, mas o bem estar humano. Se este for o foco, definitivamente construiremos uma nova sociedade.
Chegou a hora do ser humano ser humano, em toda sua integralidade.