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Este é um texto forte, que eu, honestamente, não gostaria de precisar escrever. Já adianto, que tudo que compartilharei com você aqui, vai muito além do crime ocorrido recentemente no Carrefour, mas foi ao ler os comentários, mensagens e por incrível que pareça, memes referentes àquela fatalidade, que senti uma indignação crescente e grande necessidade de trazer luz para este assunto. Para ser muito claro, este artigo é sobre preconceito. 

O que acontece conosco? Não me refiro a radicais, alt-nazis ou racistas declarados. Faço esta pergunta à maioria das pessoas em nossa população, gente como eu, que se considera progressista, que não quer ser e não se considera racista, pessoas do bem. 

Na sociedade brasileira, temos o costume de dizer que não somos racistas e realmente acredito que não temos a intenção de sê-lo, mas isso não significa que o racismo não exista. Muito pelo contrário. 

Quando eu me deparo com imagens como esta mostrada acima, compartilhadas por pessoas de boa índole e mesmo do meu convívio pessoal,  associado à história do nosso país e a índices sociais que mostram uma grotesca disparidade social, posso entender perfeitamente do que se trata o Racismo Estrutural. 

Convido vocês a assistirem ao vídeo do advogado e filósofo Silvio Luiz de Almeida, que elucida o racismo estrutural como uma forma de racionalidade, de normalização, de compreensão das relações conscientes e também inconscientes que pautam nosso cotidiano. Ou seja, são práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais, que colocam um grupo social ou étnico em uma posição melhor para ter sucesso, ao mesmo tempo em que prejudica outros grupos, promovendo direta ou indiretamente, a segregação e preconceito racial, devido a normalização de hábitos, situações, falas e até mesmo olhares enraizados em nossa cultura. 

Ou seja, é realmente difícil de perceber a intenção. Muitas vezes está num simples olhar. E assim, é tão complexo de combater pois muitas vezes sem uma frase ou agressão a confirmarem o ponto, a questão se torna subjetiva e não se enquadra nas políticas vigentes. 

Até mesmo nossas mentes são moldadas a partir de discrepâncias raciais, onde vinculamos a pele negra a sentimentos e ações negativas, uma vez que o preconceito controla não apenas o que vemos, mas a forma como pensamos, nos relacionamos, julgamos e até mesmo enxergamos pessoas, sem saber nada sobre elas, apenas pela cor da sua pele.  

Os chamados vieses cognitivos, dão origem a decisões e escolhas sem termos a consciência de nossos preconceitos, uma vez que atuam de uma maneira inconsciente, interferindo em todo o âmbito social, desde a criminalização de corpos negros (que a maioria da população carcerária do nosso país), à precarização do trabalho, até mesmo na sexualização e objetificação dessas pessoas. Recomendo fortemente a leitura do artigo da minha amiga Fátima Motta, para elucidar mais sobre este tema. 

Mas este não é um problema exclusivamente brasileiro. É um câncer global.  

O primeiro passo para se combater o racismo estrutural é reconhecê-lo, através de  indicadores concretos. Vamos esquecer, por um momento, a dor, o sofrimento, a frustração desses grupos sociais e nos ater aos fatos, como os apontados no relatório “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, publicado pelo IBGE, de 2018. 

Quando falamos que na sociedade brasileira o racismo não existe, devemos levar em consideração achismos, opiniões sem embasamento, gritos emitidos por uma classe que se beneficia diariamente de privilégios que reforçam esta estrutura racista? Ou devemos observar os dados acima e reconhecer, que em termos de sociedade, podemos juntos, reconhecer nossos erros e nos esforçar para melhorá-la?  

A filósofa americana Angela Davis pontua enfaticamente, que “em políticas públicas, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. Eu não poderia concordar mais com ela.  

Ao reconhecer o racismo estrutural e como ele afeta as estruturas da nossa sociedade, percebemos também, que o Brasil está muito atrasado quanto assumir esta responsabilidade, mas também quanto ao combate e mitigação de disparidades tão grandes quanto as apresentadas. 

A mudança estrutural é complexa e necessita de iniciativas que ajudem a população a entender a presença deste tema, assim como sua importância para que possamos evoluir, como é o exemplo do modelo Kubler-Ross, desenvolvido pela psiquiatra suíça-americana Elizabeth Kubler-Ross em seu livro de 1969 “Death and Dying” e que fala sobre os 6 estágios da perda de qualquer coisa que tenha significado para nós. 

De forma resumida, ele pode ser definido com a necessidade de assimilar a perda de privilégios, de entender como esta perda afetará a sua realidade e buscar formas de entender o significado dessa mudança para seguir em frente.  

Aqui, para que este modelo se tangibilize em sua mente, sugiro que faça agora um exercício, volte no tempo, se coloque no lugar de um empresário escravocrata no Brasil colonial, e receba a notícia de que seus escravos serão libertos. Imagine como foi o processo de assimilação desses empresários e como eles passaram por cada uma das etapas descritas por Kubler-Ross. 

Essas mudanças necessárias precisam ser implementadas através de metodologias ligadas à gestão da mudança, compreendendo também a disseminação de informações legítimas, da educação para conduzir as pessoas ao rumo correto e de propostas robustas, que incluam esses grupos sociais em posições de tomada de decisão. Sim, eu defendo intensamente a existência de cotas e outras ações de estímulo positivo e reparadoras para desenvolver uma sociedade mais integrada, justa e diversa. 

Moro no Canadá há vários anos e aqui até hoje, são desenvolvidas iniciativas para reparação dos danos causados à população indígena na colonização do seu território. Isso acontece, principalmente, porque o país entendeu a necessidade de documentar a sua história e unir as diferenças entre os povos no país para aumentar a sua potência. Isto não significa que o problema não exista, mas sim que o problema foi reconhecido e a jornada proposta por Kubler-Ross está em curso acelerado. 

Ou seja, reconhecer, reparar e agir de forma antirracista não é uma simples questão de vergonha ou culpa. É assumir a responsabilidade do passado para um mundo melhor e ajudar a construí-lo.  

O quanto antes acordarmos e entendermos que se somarmos nossa força de trabalho, desenvolvermos políticas que equiparem os privilégios sociais de todos os cidadãos, independente de sua raça, gênero ou orientação, por exemplo, encontraremos um ponto de equilíbrio para um crescimento sustentável e nos tornaremos efetivamente, a potência que desejamos ser. 

Para finalizar, trago algumas possíveis soluções para esta problemática, e que podem ser  implementadas por cada um de nós, na busca de sermos agentes de mudança em nossa família, comunidade e sociedade: 

1 – É necessário revisitar o conceito de racismo e as formas de combatê-lo, migrando de conceitos, atitudes e sentimentos, para combater os comportamentos nocivos, mais facilmente identificáveis através dos dados já disponíveis. Para ir um pouco mais a fundo no entendimento deste ponto de vista, sugiro que assista o TED Talk “How we can make racism a solvable problem – and improve policing” com o Dr. Phillip Atiba Goff, onde de forma muito consciente ele analisa que o combate ao preconceito deve ser dirigido aos comportamentos. “Desconheço minorias vindo a público pedindo para serem admiradas e amadas. O que se manifesta é a luta por comportamentos e não sentimentos”. 

2 – Mude seu posicionamento de “Eu não sou racista” para “Eu sou antirracista”. Esta mudança de conduta, de acordo com o historiador e autor Ibram X. Kendi, com a qual eu concordo, tira o indivíduo da posição de “racista em negação”, pois como demonstrei anteriormente vivemos um cenário de racismo estrutural. E o coloca na posição de alguém que admite agir de forma racista, mesmo que de forma não intencional, que reconhece as desigualdades e os problemas raciais de nossa sociedade e que também tem a intenção de desafiar estas desigualdades questionando as leis, regras, práticas e a cultura. Para entender melhor este posicionamento, sugiro que assista a uma fantástica entrevista com ele  e que está disponível aqui. 

3 – Analise de forma crítica e ativa, cada um de nossos pensamentos e ações. É necessário estabelecer resistência em todos os momentos que nossos pensamentos e atitudes (assim como os das pessoas próximas a nós) possam estar sendo preconceituosos, mesmo que de forma indireta ou inconsciente. Isto significa parar, pensar e  se questionar que tipo de viés cognitivo está me levando a esta conduta. Para ir mais a fundo neste aspecto, peço que veja este, que é um dos TED Talks mais impactantes que já assisti, com a psicóloga social, Jennifer L. Eberhardt.   

Neste ponto, eu quero encerrar trazendo uma nova provocação e um questionamento: 

A provocação: todo raciocínio expresso neste artigo se aplica de forma exatamente igual às diversas outras formas de preconceito que nos deparamos no cotidiano, como por exemplo as questões: da mulher, de gênero, ligadas à população indígena, à população do nordeste, e assim por diante, sem restrições. Basta fazer o dever de casa e buscar os dados que estes evidenciarão o desequilíbrio a que estes grupos são submetidos. 

A pergunta:  após conhecer todo este raciocínio proposto, como você se sente com relação a memes e comentários triviais na cultura brasileira, como por exemplo estes que postei a seguir? O que mudou em seu entendimento e sentimento? Qual será sua reação doravante? 

PS: Se você quiser conhecer um pouco mais o que penso a este respeito,  assista a live que realizei em 24/11 em minhas redes sociais. Confira também o bate-papo que se desenvolveu na live da minha amiga Fátima Motta, sobre preconceito e vieses inconscientes de forma geral, para entender a importância dessa mudança no caminho para uma sociedade melhor. 

Um comentário

  • Cesar Leite disse:

    Parabéns pela abordagem e pelo contexto Adriano Amui. Este é um assunto que precisamos todos abordar, encarar e mudar muito o status quo existente.
    A postura de todos precisa ser anti racista, anti preconceito, pró diversidade, pró inclusão, pró pluralidade, etc… ou seja, anti qq coisa que reduza, gere intolerância e qq tipo de discriminação
    Não basta mais apenas concordar, temos que ser ativistas do tema, até mudarmos a sociedade.
    Que bom que Dynamic Mindset tem abordado bem isto nos artigos da Ana Tércia e neste teu 🙂

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Adriano Amui

Empreendedor (Esfera, Invent, Deep Seed Solutions, Portal dos Livreiros e FCA Strategy), Mentor, Professor e Palestrante (FDC, ESPM e SFU Beedie Business School) com foco em Planejamento Estratégico, Estratégia Competitiva, Novos Modelos de Negócios, Empreendedorismo, Go-to-Market, Novos Negócios, Marketing, Design Thinking, Inovação e Transformação Digital. Ver perfil completo >>