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Na bela letra de “Oração ao Tempo”, de Caetano Veloso, ele é um senhor tão bonito quanto a cara de um filho. É tão inventivo e parece contínuo. De fato, podemos enxergar o tempo em sua poética, em sua beleza. Mas, na prática, no dia a dia, muitas vezes, ele pode virar um inimigo. Ou um grande amigo – dependendo de como se convive com esse recurso, não é?

Com a possibilidade de realizarmos mais rapidamente algumas tarefas que antes exigiam mais tempo, por exemplo, seria natural imaginar que sobrariam umas horas a mais na vida. No entanto, ocorre exatamente o contrário: a maioria das pessoas se queixa constantemente da falta de tempo.

Nossa rotina é carregada de apps, gadgets, redes sociais, contatos que se somam aos muitos compromissos profissionais e sociais. Obviamente, isso faz tudo parecer mais rápido também. E nem é uma observação individual – os próprios cientistas confirmam que o mundo está mais acelerado. Em 2019, a Terra completou a rotação mais rápida até então registrada.

E como essa questão impacta no mundo corporativo? Bom, a gestão do tempo é uma pauta recorrente nas organizações, obrigando-nos a priorizar o que é realmente prioridade e organizar o que pode ser feito amanhã. Mas não universalmente.

Infelizmente, o tempo é desigual. Quem precisa acordar muito cedo, enfrentar mais de uma condução para chegar ao trabalho e repetir esse ciclo todos os dias enxerga as 24 horas do dia de forma muito diferente. Na contramão, quem dispõe de maior facilidade de acesso, mais tempo para dormir, fazer hobbies e aproveitar a vida íntima talvez possa encontrar mais beleza no tempo. Digo isso porque é importante pensarmos nessas diferenças, principalmente em tempos com tanto influencer propagandeando mundo afora as virtudes de acordar às 4h da manhã para uma vida fitness, etc.

Voltando às organizações, vejo como um desafio hoje a gestão do tempo das lideranças. Essa é uma das competências mais críticas, ainda mais em ambientes de alta complexidade e pressão. De acordo com estudos da Harvard Business Review (HBR) e do MIT Sloan Management Review, líderes enfrentam desafios crescentes para equilibrar demandas estratégicas x operacionais, reuniões em excesso x tempo de foco profundo, gestão de equipes remotas ou híbridas e tomada de decisão com sobrecarga informacional.

A administração do tempo é uma grande questão para os líderes, e é preciso olhar para isso.

Esse combo traz impactos diretos no dia a dia das lideranças. Pode-se tomar decisões apressadas, com a falta de tempo para uma análise criteriosa e estratégica. Outro impacto é menos inovação, com pouco pensamento proativo em detrimento do reativo. A questão do tempo também pode interferir na percepção das reais dores das equipes, quando o líder não consegue parar para observar o time com atenção, causando um desalinhamento. Por fim, o excesso de reuniões e atividades multitarefas pode levar ao desgaste mental e emocional (burnout).

Vejamos algumas pesquisas importantes para entendermos essa complexidade:
Harvard Business Review (2022) analisou mais de 60 mil horas de trabalho de CEOs:
• 72% do tempo é gasto em reuniões.
• 28% do tempo restante é dividido entre análise individual, leitura, tomada de decisões e e-mails.
• Menos de 10% do tempo semanal é reservado para atividades de pensamento estratégico.

McKinsey & Company (2023):
• Apenas 9% dos líderes seniores afirmam que “gerenciam muito bem seu tempo”.
• 48% sentem que perdem tempo com atividades que não agregam valor diretamente.

Microsoft Work Trend Index (2023):
• Líderes gastam, em média, 7 a 11 horas por semana gerenciando e-mails.
• 60% relataram que têm menos tempo para liderar pessoas do que gostariam.

O que podemos fazer neste cenário?

Com esse retrato em mãos, fica a pergunta: é possível fazer um acordo positivo com o tempo hoje? Acredito que sempre é possível analisar cenários para mudarmos o que é preciso. Há algumas práticas que podem ajudar, como no meeting day (bloco de tempo protegido para foco estratégico, um dia sem reuniões), treinar equipes para decisões autônomas (delegação consciente), uso de tecnologias de apoio (Inteligência Artificial) para agendamento, priorização automática de e-mails e uma revisão semanal das atividades em função do impacto e alinhamento com os objetivos estratégicos.

Por fim, vale lembrar que a má gestão do tempo tem impacto direto no desempenho das lideranças e na cultura das organizações. A saída é a qualidade do tempo investido, e não a quantidade de horas trabalhadas. Líderes que promovem autonomia, foco e propósito conseguem driblar os desafios que os novos tempos trazem.

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José Alfredo Nahas

Administrador de Empresas com pós-graduação em Desenvolvimento Comunitário pela Universidade de Lisboa e no Programa Avançado em ESG pela Escola de Negócios Saint Paul. Mais de 30 anos de carreira com passagem pelo Terceiro Setor e mundo empresarial. Após iniciar a sua carreira na AMBEV, como gerente comercial, atuou por 20 anos na ONG Parceiros Voluntários, tornando-se superintendente e liderando a equipe executiva, com report direto para o presidente do Conselho de Administração. Desde abril de 2024, ao aceitar um convite para retornar à AMBEV, assumiu a Diretoria de Gente e Gestão do Grupo Rotele, empresa responsável pela comercialização e distribuição da Cervejaria na cidade de Campo Grande (MS) e região.