Imagine um grande auditório corporativo. O CEO sobe ao palco, com um sorriso brilhante (com lentes de contato – na minha época, isso nem existia!) e um PowerPoint pronto para impressionar. O slide de abertura? Uma foto diversa: um homem branco, uma mulher negra, um asiático e, claro, um idoso simpático (provavelmente figurante de banco de imagens). Ele olha para a plateia e dispara:
“Na nossa empresa, a diversidade não é um dever, mas um valor!”
E pronto! Todos os presentes suspiram aliviados. Missão cumprida. Mais um ano de comprometimento com a inclusão sem precisar mudar absolutamente nada. Palmas para a hipocrisia corporativa!
Fico pensando: será que a inclusão e a diversidade são, de fato, o motor da inovação ou apenas um bordão da moda, seguido pela pressão social?
Se você já trabalhou em uma grande empresa, sabe que o discurso de diversidade está sempre presente – mas o que realmente acontece dentro das salas de reunião e dos processos de evolução nas corporações?
- O programa de diversidade foi lançado? Sim.
- A empresa contratou uma consultoria para ajudar? Sim.
- Criaram um comitê de inclusão com funcionários “diversos”? Sim.
- Esses funcionários têm poder de decisão real? Bom… aí já é pedir demais.
O problema é que, para muitas organizações, diversidade ainda é uma métrica de marketing (… você vai observar ao longo do artigo que isto não é uma crítica…). Algo que entra no relatório anual, mas que raramente influencia decisões estratégicas. A pergunta que ninguém faz: estamos contratando diferentes culturas, crenças e raças porque realmente entendemos seu valor, ou porque precisamos marcar a caixinha do ESG para os investidores?
Uma questão que sempre está presente em meus pensamentos sobre o tema: quais são as métricas claras de resultados que estamos medindo em relação à inclusão? Não acredito que a metafísica seja suficiente, ou seja, 10 negros, 5 pardos, 1 idoso etc.
Entendo que inclusão é muito mais do que isso. Para mim, inclusão não deveria ser a palavra. Aliás, deveria ser “Programa de Oportunidades Iguais para Todos”. Quem está sendo incluído é porque foi excluído, e assim continuamos tratando de forma desigual.
Vou dar um exemplo. Lembra quando você era pequeno e não podia ser “batido” no pique-esconde (esconde-esconde) porque era considerado “café com leite”? Ou seja, podia brincar junto, mas as métricas e regras eram diferentes. Tenho certeza de que os “teoricamente não incluídos” não querem ser café com leite. Apenas querem oportunidades iguais, sejam elas promoções, cargos e até mesmo apontamentos por baixo desempenho.
Agora, sejamos justos. Existem empresas que realmente entenderam o jogo. Vou fazer uma análise de casos internacionais aqui, pois são emblemáticos, mesmo sendo apresentados neste artigo de forma “rasteira”. Mas deixo claro que existem milhares de empresas em nosso país que já aproveitam da melhor forma possível a miscigenação e a inclusão efetiva para gerar mais e mais valor.
Esses são exemplos de movimentos inovadores que surgiram a partir de ambientes verdadeiramente diversos. Apenas um resumo simples, mas que demonstra como a diversidade gera valor:
- Spotify e a diversidade cultural na criação de playlists: A empresa sueca não apenas contratou pessoas de diferentes países, culturas e raças, mas usou essa diversidade para transformar sua plataforma. O algoritmo de recomendação musical foi ajustado com base em comportamentos culturais variados, permitindo que playlists como Descobertas da Semana e Radar de Novidades fossem um sucesso global.
- Microsoft e a acessibilidade digital: Com times diversos, que incluem profissionais com deficiência, a Microsoft criou inovações como o Xbox Adaptive Controller, projetado para gamers com mobilidade reduzida. Algo que dificilmente sairia de uma reunião composta por executivos que nunca enfrentaram essas dificuldades.
- Airbnb e a inclusão de perspectivas globais: Quando o Airbnb percebeu que anfitriões estavam discriminando viajantes por raça e origem, decidiu agir. Criaram políticas rigorosas, mudaram algoritmos e passaram a investir em treinamentos baseados na visão de times multiculturais. O resultado? Um crescimento global sustentável.
Sei que muitos vão dizer que os casos apontados acima são de empresas globais e que elas possuem recursos para isso. Minha visão aqui não tem nada a ver com dinheiro, mas sim com mindset e cultura de inovação. Líderes inovadores nem sempre pensam no curto prazo. Entendem que pensamentos diversos geram valor. Culturas distintas desenvolvem maior capacidade de empatia entre membros do time, gerando maior humanização.
A consequência de tudo isso? Pensar mais no cliente.
Mas o que ocorre quando a diversidade é só um enfeite?
Vou me arriscar a falar deste outro lado da moeda: empresas que usam diversidade como um selo decorativo. Aquelas que fazem campanhas incríveis sobre inclusão, mas onde o conselho de administração parece uma reunião de ex-alunos de uma escola suíça dos anos 1950.
Cenário clássico:
- O RH contrata uma pessoa trans ou um profissional negro para mostrar “comprometimento com a inclusão”.
- Esse funcionário percebe que não tem espaço para crescer e que seu papel é mais simbólico do que estratégico.
- Ele sai da empresa, e no próximo relatório, a culpa é atribuída à “falta de fit cultural”.
Afinal, diversidade é ótima… até o momento em que alguém sugere mudar a forma como o poder é distribuído.
É mais ou menos como aqueles programas de “melhor lugar para se trabalhar” ou aqueles prêmios de “empresário do ano” dados pela revista X. Ou seja, muita mídia, pouca realidade. É claro que há muitas empresas que genuinamente adotam tais práticas e de fato cumprem com as premissas de inclusão.
Se uma empresa quer usar a diversidade apenas como um item da lista de obrigações sociais, parabéns, está na média. Mas, se realmente deseja inovar, precisa entender que diversidade não é sobre “ajudar minorias” – é sobre ganhar vantagem competitiva ao reunir mentes que têm visões, vivências e dilemas diferentes e que possuem muita capacidade.
Oportunidade é tudo. Sabemos que vivemos em uma sociedade preconceituosa. O tema é relativamente novo (sempre foi velado, ou eram os outros que tinham preconceitos… vai entender!). É como quebrar crenças limitantes. Mesmo que não esteja tão enraizado, temos que forçar a inclusão até que um dia isso seja natural e ninguém precise falar sobre o assunto.
O que quero dizer com isso: temos que incluir, dar oportunidades, experimentar e gerar muito valor disso tudo. Nosso país sempre foi e sempre será assim. Afinal, um time composto apenas por clones do mesmo perfil não cria revoluções.
O futuro pertence às empresas que entendem que diversidade não é um favor, mas um caminho inteligente para inovação e crescimento.
Agora, se sua empresa ainda acha que diversidade é só um evento do RH com um coffee break especial… bom, talvez esteja na hora de atualizar esse PowerPoint. Ou, como diria aquele curso: morte ao PPT.
Muito bom! É por aí!
Excelente texto! Infelizmente ainda percebemos muito do “teatro da inclusão e diversidade” ocorrendo nas organizações.
Muito bom o texto.
Realmente reflete uma boa parte das empresas.