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É segunda-feira, 8h da manhã. O profissional liga o computador e espera. Enquanto a máquina inicializa, roda antivírus, aplica atualizações e carrega scripts de rede, os minutos passam lentamente. Quando finalmente consegue abrir a primeira planilha, precisa esperar mais alguns segundos até que o Excel carregue todas as fórmulas. À tarde, diante de um contrato no Word, a cena se repete: o arquivo demora longos segundos para responder, como se a máquina tivesse mais preguiça do que o próprio usuário. No meio de uma reunião, surge a mensagem que todos já conhecem: “Instalando atualização 1 de 47”. Entre um clique e outro, a rotina corporativa é atravessada por microesperas que, individualmente, parecem inofensivas, mas que, no agregado, transformam-se em uma perda monumental de tempo, energia e concentração.

Esse fenômeno tem nome na psicologia cognitiva: Interruption Science, ou ciência da interrupção. Cada vez que somos forçados a esperar uma barra digital de progresso, o cérebro perde o estado de fluxo — ou seja, aquele momento raro em que estamos totalmente concentrados em uma tarefa — e precisa de tempo para se reconectar. Pesquisas da Prof. Gloria Mark, da University of California, e de Adamczyk & Bailey, da Universidade de Illinois, em estudo clássico de 2004, demonstraram que, após uma interrupção, levamos em média 23 minutos para recuperar o mesmo nível de foco.

O que está em jogo, portanto, não é apenas o tempo que um software demora para processar, mas o custo da retomada, conhecido como resumption lag, ou custo da retomada. Uma pausa de 30 segundos diante de um Word travado pode significar muito mais do que 30 segundos perdidos: pode representar minutos adicionais até que a mente consiga reencontrar o ritmo original do que pretendia realizar.

Os números confirmam o tamanho da sangria. Pesquisas da Universidade de Copenhague e da Roskilde University, ambas na Dinamarca, apontam que entre 11% e 20% do tempo de trabalho diante do computador é desperdiçado em lentidão, falhas ou sistemas mal projetados. Outro levantamento revela que profissionais perdem, em média, 22 minutos por dia com problemas técnicos. Multiplique: são exatamente duas semanas de trabalho jogadas fora todos os anos por problemas de tecnologia.

Em outro exemplo corriqueiro, se você demora 20 segundos para abrir um arquivo e abre 50 arquivos por dia, terá perdido 16 minutos e 40 segundos diários apenas esperando. Em um ano, isso equivale a 60 horas, ou 7,6 dias úteis inteiros. Mais de uma semana de trabalho desaparece diante da tela. Agora, imagine esse cálculo multiplicado por uma equipe de 500 pessoas: o que parece detalhe transforma-se em centenas de dias de salário desperdiçados, em projetos atrasados, em inovação sufocada.

E não estamos falando apenas de abrir e salvar documentos. Há camadas adicionais de atraso: aplicativos diversos que, em nome de supostos testes de identificação ou segurança, levam longos segundos só para liberar a primeira tela de uso; buscas travadas na internet; carregamentos de sites pesados, repletos de anúncios que roubam ainda mais a atenção; sincronizações intermináveis no correio eletrônico ou no drive virtual. Cada evento adiciona segundos que se somam e corroem horas preciosas.

O cotidiano digital tornou-se um campo minado de pequenas esperas, todas aparentemente justificadas, todas apresentadas como “custo da modernidade”.

O impacto, no entanto, vai além do financeiro. Cada espera é uma fratura no psiquismo de quem trabalha com tecnologia. A sensação de impotência diante da máquina que não responde gera frustração, irritabilidade e uma percepção de inutilidade.

Criou-se uma cultura silenciosa de aceitação da lentidão, como se fosse normal passar boa parte do dia olhando para telas congeladas. Mas não é normal. A tecnologia que prometeu liberar tempo para criar, pensar e inovar acabou transformando-se, muitas vezes, em uma coleira invisível que rouba o bem mais precioso que temos: o tempo e a concentração.

Não é à toa que o smartphone se tornou mais popular que o microcomputador tradicional: sua resposta, na maior parte dos casos, é mais ágil e intuitiva. Talvez, no futuro, um par de óculos integrado ao corpo seja ainda mais natural do que o celular de hoje. A trajetória parece apontar para dispositivos cada vez mais rápidos e incorporados à vida, mas o paradoxo permanece: enquanto sonhamos com a velocidade do amanhã, ainda tropeçamos nas lentidões do presente.

Vivemos na era da Inteligência Artificial, de carros autônomos e foguetes reutilizáveis, mas ainda somos reféns de softwares que travam em momentos críticos, de sistemas que insistem em reiniciar no meio do expediente, de interfaces que confundem mais do que ajudam. A alta produtividade nesse ambiente é uma ilusão. Os dashboards e telas de Business Intelligence podem exibir números otimistas sobre os negócios, mas a realidade é que cada profissional, a cada dia, perde pedaços da própria vida em espera improdutiva.

Governança tecnológica, portanto, não é luxo: é sobrevivência. Medir o tempo morto, investir em desempenho de hardware e software, revisar contratações defasadas para exigir eficiência e reduzir fricções deveria ser pauta estratégica. O verdadeiro ROI (return on investment) da tecnologia não está no preço da licença, mas no tempo devolvido às pessoas. Porque dinheiro se recupera; tempo perdido, jamais.

No fundo, a questão não é apenas sobre produtividade, mas sobre dignidade. Quando, a cada clique, aceitamos esperar; quando normalizamos travamentos e barras de progresso, estamos cedendo nossa capacidade de foco, nossa energia mental e nossos dias de vida a sistemas que deveriam nos servir.

Cada segundo diante de uma tela congelada não é apenas tempo: é concentração quebrada, energia desperdiçada, vida fragmentada. E, enquanto continuarmos aceitando esse sequestro invisível, seguiremos reféns de uma tecnologia que, em vez de acelerar, nos atrasa.

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Reges Bronzatti

Gerador de Valor para Negócios com Tecnologia. Apaixonado por Gestão, Inovação, Direito Digital, Privacidade e Empreendedorismo. Advogado. Mestre em Ciência da Computação. Conselheiro Empresarial.