Contexto
Foi na suíça, ao final do século XIX, que Nietzsche teve um dos insights mais bonitos de sua jornada. E foi de forma espontânea, ao caminhar próximo a um lago refletindo sobre a vida, onde parou para observar uma pedra em formato de pirâmide e teve o primeiro vislumbre do que seria o Eterno Retorno.
Esta ideia surgiu ao constatar que, se o universo é feito de certa quantidade de matéria e o tempo é infinito, em algum momento a combinação atual de átomos do universo teria que se repetir, mesmo que levasse muito (muito!) tempo para isto acontecer, a nossa vida aconteceria novamente exatamente da mesma forma uma e outra vez, assim como já teria acontecido incontáveis vezes no passado.
Vale a pena lembrar que Nietzsche não era físico e estamos falando do século 19, então o foco não é no sentido literal deste pensamento, mas sim como um gatilho que desencadeou pensamentos brilhantes (não no mundo científico/cosmológico) mas na linha de pensamento filosófica e existencial que é possível tirar desta possibilidade de um “looping” eterno onde viveremos nossa vida, exatamente como estamos vivendo, incontáveis outras vezes, para toda a eternidade.
Reflexão
Ao propor que o indivíduo pense sobre este ponto, Nietzsche nos deixou o seguinte questionamento:
“A pergunta diante de tudo e de todas as coisas: Você quer isto mais uma vez e incontáveis vezes?”
Se você soubesse que este momento (e todos os outros) de vida se repetiriam incontáveis vezes, exatamente como é/foi, você ficaria feliz ou apavorado?
Quais momentos de sua vida você sentiu que poderia viver aquilo eternamente…que, naquele instante, você desejou que o tempo não passasse… que a sua plenitude em relação ao presente foi tamanha que o tempo simplesmente parou?
E, por outro lado, qual momento foi tão ruim, dispensável, banal que você desejou que o tempo passasse rápido, que você desejou que a linearidade do tempo lhe salvasse daquele instante.
Se seus instantes se assemelham mais à primeira frase, certamente o conceito do eterno retorno lhe agrada e reforça o seu amor à vida. Se seus instantes se assemelham a segunda frase, certamente pensar em revivê-los, eternamente, lhe assustará.
A proposta então é mergulhar dentro de si, encontrar o que faz o seu tempo parar, sair da linearidade do tempo através de momentos que você não queria de terminassem, enfrentar o eterno retorno como um presente do destino por poder reviver a sua vida outra e outra vez.
Mas não se engane, esta reflexão não é nem um pouco simples… quanto mais você mergulha em si mesmo, mais descobre que: abaixo das superficialidades e convenções morais, onde se encontra o seu “Eu” verdadeiro, as respostas para o seu real caminho e decisões podem não ser as mais óbvias.
O universo, a sociedade, o contexto em que estamos inseridos tentará te dissuadir e te convencer do contrário. Mas você sabe. No fundo, você sabe de quais micromomentos estou falando.
Muitas vezes você aceita estes instantes “não-eternos” por algum senso de obrigação que na verdade só existe em sua mente e que só caberá a você mudar o seu caminho ao em encontro de sua plenitude.
Como me disse uma vez um grande professor:
“Quem não estiver disposto, não tiver coragem, por causa da dor, a descer em si mesmo, não poderá responder as perguntas da vida”
Ou ainda, como aconselha o próprio Nietzsche: Torna-te quem tu és.
Relevância na atualidade – Pensamento Dinâmico
Em um mundo imerso em superficialidade e cheio de vazios, impossível ser mais atual do que esta reflexão.
Quando falo de pensamento dinâmico me refiro a tão famosa necessidade de se reinventar.
E a provocação de Nietzsche é justamente esta. É se permitir refletir sobre o seu presente.
É refletir e, se for o caso, refazer a sua escala de valores.
É se despir do ontem para que um novo amanhã possa surgir viabilizado por um presente reformulado.
É se conhecer de fato, para que enfim possa abraçar o caos da realidade com alegria e leveza.
É entender que a sua felicidade importa, não importa que tentem te convencer diariamente do contrário.
Por fim
Nietzsche não chegou a concluir este conceito em seus estudos, deixando muita margem para interpretações distintas e diferentes perspectivas. E mesmo eu não concordando com muita coisa deste autor, ainda o considero um dos homens mais brilhantes que passou pela terra.
Do conceito do eterno retorno, fica a reflexão individual por uma vida plena.
Pela valorização de cada instante e do presente, aqui, agora.
Por uma vida que queiramos reviver eternamente.
Pelo amor à vida.
Amor Fati.
Nooossa. Explicação maravilhosa sobre um pensador tão denso e hermético. Parabéns!